QUEDA LIVRE
Não tenho o álcool,
o ópio,
o lexotan,
o sono nem a morte
para me dar suporte.
Tenho a cirurgia sem anestesia,
o corte e a dor,
hemorragia que não estanca,
a cor vermelha sobre fundo branco.
Lena Jesus Ponte
MOSAICO
Angra aqui e agora.
Angra fora e dentro.
Sentimento e memória.
Estilhaços de passados.
Cacos coloridos de momentos.
Futuros embrulhados pra presente.
Brasil dos Reis cavalga seus sonetos.
Tropel de rimas, métricas, quartetos e tercetos...
Alípio e Cunhambebe têm segredos
que o sino da Matriz conta sem medo.
Cartografia de ilhas ancestrais.
Mastros de barcos tricotam o vento.
Garças bordadas na tarde.
O sol desenrola seu novelo e fia lã de lua.
Ruas serpenteiam movimentos
e calidoscópicos sons pelos ares.
Sinfonia de cores escalando morros. Vidas verticais.
Tambores de jongo desafiam tambores nucleares.
Fantasmas coloniais visitam as madrugadas.
Lena Jesus Ponte
DE PASSAGEM
Na rua dorme um menino
sem lençol de afeto.
Na rua sonha um menino
sonhos sem imagens.
Na rua seca um menino
sem sequer as miragens de um deserto.
O menino dorme,
abraçado à calçada,
aconchegado ao cimento.
Que faz todo mundo neste momento exato?
Dormimos todos um sono profundo.
Lena Jesus Ponte